Por Ismael Braz de Oliveira, estudante de Teologia da Universidade Metodista
de São Paulo
O amor é cego. É o que costumeiramente se diz. Cego
por não ver aparência, não enxergar circunstâncias, enfim, o amor é cego.
Poderíamos também, dizer que o amor é irracional. Não pensa. Não formula
equações lógicas. Não faz cálculos. Creio ser isso que Pascal quis dizer ao
falar que “O coração tem
razões, que a própria razão desconhece”.
Reflito nessas palavras, mas não as entendo. Talvez
porque o coração não possa ser entendido. Esse impulso de amar, de querer bem a
outro. De ir contra toda lógica e regra que exista, desafiando aquilo que
sabemos. Desafiando os perigos que conhecemos. Todo nosso sistema de segurança.
Quebrando toda razão.
É o tipo de amor de Dom Quixote por Dulcinéia,
que na verdade não passava de uma camponesa. Mas que aos olhos, “cegos”, de Dom
Quixote ia, além disso. Ela era a razão de suas aventuras. Por quem valia à
pena enfrentar os ventos dos moinhos. O amor é realmente irracional.
Mítia[1] que o diga. Perde-se loucamente, ao
se apaixonar por Grúchenka, mulher de má fama. Ficando cego ao ponto de cometer
todo tipo de loucura em função de seu amor. Não lhe importava o que lhe diziam.
Não via com a lógica dos olhos ou da mente. Via com as desconhecidas razões do
coração.
Se existisse razão, trabalharia Jacó sete anos por
Raquel? Quem sabe a lógica de muitos seria de dizer a Jacó que era loucura o
que ele estava disposto a fazer. Ele os ouviria? Creio que não.
Amor é também desprovido de condições. Por que você
ama? Podem perguntar a quem está amando. A resposta certamente será: amo por
que amo. Não existem condições para se amar. Se condição houver, então não é
amor. O que oferece o filho para a mãe amá-lo? Quem sabe não seja por isso, que
amar e sofrer andem lado a lado. Porque esse impulso irracional de amar, pode
se tornar uma mão única, de sempre dar e nunca receber. O sofrer consiste em
querer receber, mas nada ganhar e mesmo assim, continuar a amar.
Ouvi uma música da banda americana New
Radicals que me fez pensar na questão da irracionalidade e
incondicionalidade do amor. Someday we’ll know é a música.
Nela é retratada uma série de perguntas, como por exemplo, se o capitão do Titanic chorou.
A música continua na perspectiva de que um dia saberemos a respostas de algumas
perguntas. Uma dessas perguntas é porque Sansão amou Dalila.
Intrigado com o porque Gregg Alexander, vocalista
da banda, cita em sua música o amor de Sansão por Dalila. Recorro à narrativa
bíblica, que se encontra no livro de Juízes capítulo 16. Sansão era um juiz em
Israel. Homem de uma força sobrenatural. O segredo de sua força estava em seus
cabelos. Sansão que matou mil homens com uma queixada de um jumento. O homem
que era temido por seus inimigos. Respeitado por seu povo. Agora se encontra
com uma mulher chamada Dalila e o texto diz que ele se apaixona por ela.
Dalila fazia parte do povo inimigo de Sansão. Com
toda certeza, não era uma pessoa confiável. Mas Sansão se apaixona por ela. E
com o amor, não existe reputação ou condição. O homem que sozinho, enfrentou
mil homens, agora sucumbe, diante de apenas uma mulher. Dalila se utiliza do
amor de Sansão para traí-lo. Sansão entrega seu segredo por amor. Por ter sua
alma afligida por ter seu amor colocado em dúvida.
O que dizer do amor de Oséias por Gômer? Não somos
culpados de querer quem queremos. Por isso, que quando me dizem para não me
embrenhar em algo que vai me machucar. Para não esperar o que talvez nunca
venha. Lembro, que por mais que eu consiga raciocinar e equacionar as
implicações do ato de amar, o que sempre prevalecerá é a razão do coração. Por
isso não julgo um marido ou esposa, traído, que retorna para sua (seu) amada
(o). Não ouso acabar com os sonhos de alguém apaixonado. Não me apresso a questionar
a escolha de alguém. Porque no final, não quero que a mim o façam.
Encerro dizendo que não acredito que um dia
saberemos por que Sansão amou Dalila. Não acredito que saberemos por que os
poetas escreveram seus poemas. Não acredito que saberemos os porquês de tantos
atos de amor. Não creio, simplesmente, pelo fato de que eu mesmo nunca saberei
por que quero quem eu quero.
Se alguém perguntasse a Sansão porque ele amou
Dalila, creio piamente, que a resposta seria essa: Não sei, apenas amei! No ato
irracional de amar, não existem equações, só o resultado, que é o amor.
Porque dois mais dois são quatro? O não saber o
porquê, não muda o fato de que dois mais dois são quatro. Às vezes perdemos a
chance de amar, por querer antes de tudo, fazê-lo passar pela prova da
razão. Racionalizar o amor é perder o momento eterno e
singular, proporcionado pelo irracional e incondicional ato de amar.
[1] Personagem
de Os Irmãos Karamazov de Dostoiévski.
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